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31/08/2010 03:00

POLÍTICA FISCAL ENFRENTARÁ MUDANÇAS

O próximo governo precisará adotar medidas de contenção da expansão da dívida mobiliária A evolução da dívida bruta tem suscitado questionamentos a respeito do risco fiscal de médio e longo prazo. No curto prazo, a emissão de títulos da dívida mobiliária com o fim de conceder crédito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) explicou boa parte da trajetória de alta mais expressiva do indicador. Mas a evolução das operações compromissadas, segundo principal componente da dívida bruta, tem concentrado parte importante na expansão da dívida quando analisado um horizonte de mais longo prazo. Desde o fim de 2005, quando as reservas cambiais assumiram trajetória de alta, o Banco Central (BC) passou a acelerar a atuação no mercado aberto por conta da necessidade de esterilizar o efeito do aumento das reservas. As reservas cambiais aumentaram de R$ 118,1 bilhões em abril de 2006 para R$ 483,3 bilhões em dezembro de 2008. No mesmo período, as operações compromissadas passaram de R$ 86,7 bilhões para R$ 325,2 bilhões. O outro condicionante do aumento das compromissadas é o avanço do crédito ao BNDES. Os desembolsos da instituição têm aumentado de forma expressiva, impactando o crédito total e exigindo enxugamento por meio das operações compromissadas. Assim, para entender o que deve ocorrer com essas operações daqui em diante, investigamos três pontos: 1) a dinâmica esperada para as reservas, já que foram as principais responsáveis pelo crescimento das operações compromissadas, 2) como se dá, com mais detalhes, a relação entre reservas e compromissadas e 3) de que forma o aumento da atuação do BNDES tem exigido maior intensidade no enxugamento de liquidez. O forte crescimento das reservas é reflexo do modelo de crescimento "adotado" pelo Brasil somado à atratividade externa. Com baixa poupança doméstica (pública, principalmente) e elevada poupança externa - déficits em transações correntes persistentes - o país cresce, mas a forte entrada de dólares exige que o Banco Central atue no mercado. Isso significa que, ao entrar comprando os excessos de divisas, o BC promove o aumento das reservas de forma acelerada, gerando expansão de reais na economia, que precisam ser esterilizados via operações no mercado aberto. Sendo assim, a atratividade somada a crescimento gera necessariamente uma contrapartida: o aumento das reservas cambiais, que é positivo, porque amplia ainda mais o nosso seguro contra volatilidade externa, mas é negativo na medida em que gera custos fiscais em função da esterilização. Mesmo que obtivéssemos um aumento da poupança doméstica, nos próximos anos, reduzindo os déficits em transações correntes e, portanto, a necessidade de entrada de capitais para contê-los, necessariamente continuaríamos atrativos, "ceteris paribus", sob o pressuposto de que esse aumento de poupança doméstica viria por um esforço fiscal maior. Em outras palavras, continuaríamos atraindo capital externo e aumentando as reservas. Assim, é necessário entender o quanto será exigido no lado das operações compromissadas, para fins de esterilização. Quanto ao BNDES, sabe-se que o avanço dos desembolsos nos últimos anos tem sido forte, com mudanças estruturais no curto prazo desde setembro de 2008, dada a atuação do Tesouro, que promoveu emissão de títulos robusta para conceder crédito ao banco. Além dessa fonte de recursos, o BNDES conta com os recursos do FAT e de outras fontes, o que, de fato, gera efeitos expansionistas. Mas os recursos advindos da emissão de títulos pelo Tesouro acabam tendo efeito monetário neutro, praticamente, já que os títulos emitidos, em primeiro momento, são depois monetizados para que o banco possa emprestar. Realizamos um exercício quantitativo para avaliar as ideias acima descritas. Os resultados indicam que, para cada 1% de variação nas reservas, ocorreria uma variação na mesma direção das compromissadas em 1,1%, enquanto para uma variação de 1% nos saldos do BNDES, ocorreria uma variação positiva nas compromissadas da ordem de 0,65%. A partir disso, pode-se dizer que 1) se é verdade que o Brasil manterá posição relativa favorável, nos próximos anos, crescendo e atraindo capital externo, as reservas continuarão a aumentar; 2) com isso, a probabilidade de que as operações compromissadas continuem a se expandir é alta, impactando a dívida bruta e exigindo austeridade fiscal ainda maior na contenção do avanço da dívida mobiliária; e 3) a manutenção da política expansionista pelo BNDES também constituiria fator de pressão sobre as operações compromissadas, sem mencionar o efeito da concessão de crédito via emissão de títulos públicos, que já produz impactos de curto prazo sobre a dívida bruta. Tais conclusões indicam que o próximo governo precisará adotar medidas de contenção da dívida mobiliária, não apenas pela composição de uma política fiscal mais austera e que vise à redução mais rápida do déficit nominal do setor público, mas também pelo problema das operações compromissadas, que continuará pressionando o endividamento. Em outras palavras, a austeridade exigida será ainda maior e medidas expansionistas, definitivamente, precisarão ser abandonadas. Fonte: Valor Econômico

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