Rodrigo César Marinho - Advogado e Professor O tema da guerra fiscal não é novidade na ordem jurídica brasileira. A essência da forma federativa de Estado escolhida pelo Brasil é propícia para o fomento de conflitos entre os entes políticos participantes desta Federação, notadamente no âmbito tributário. Uma das principais características de uma federação é a existência de múltiplas pessoas políticas autônomas. No Brasil, temos a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. A Constituição atribui a cada um deles competência para legislar sobre diferentes matérias. No âmbito tributário, cada pessoa política de direito público interno é competente, exclusivamente, para criação de diferentes tributos. A autonomia política inerente a cada um dos entes federados é o fator que contribui para a formação desses conflitos. Cada ente político é competente para criar sua própria legislação em matéria tributária. Os Estados podem regular a incidência tributária do ICMS, por exemplo, da forma como entender correta. E, nesse ponto, a convergência de interesses é quase nula. Cada ente federado legisla em favor de sua própria política econômico-financeira, lançando mão de todos os artifícios para alcançar seus objetivos. O choque de interesses é inevitável. Em matéria tributária, este choque de interesses é denominado de guerra fiscal. Nesta guerra fiscal, os entes políticos travam verdadeiras batalhas para aumentar o seu quadro de contribuintes. Esse crescimento implica no aumento dos postos de trabalho, incrementando a economia e favorecendo o desenvolvimento da União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. Ocorre que, muitas vezes, os entes políticos, sob a tutela dos ensinamentos de Maquiavel (“os fins justificam os meios”), ultrapassam os limites de sua autonomia, o que pode ser representado pelo desrespeito à estrutura normativa nacional que pretende evitar estes conflitos, bem como pela invasão no campo da competência inerente aos outros entes federados. É um equívoco imaginar que a chamada guerra fiscal é exclusividade do Brasil ou somente pode ser identificada entre entes de uma mesma federação. Ela existe há séculos, inclusive entre nações. E, a probabilidade de sua extinção muito se aproxima de zero. Instrumentos normativos reguladores são criados constantemente, sempre com a intenção de minimizar os impactos da guerra fiscal sobre os contribuintes, mas a edição destes instrumentos, muitas vezes, por parte da União (em caráter nacional e, cujos mandamentos devem ser obedecidos por todos os entes federados), não reduz o fervor da guerra fiscal. Pode, eventualmente, mudar o seu rumo ou proteger os contribuintes atingidos indiretamente, mas não exterminá-la. É certo que há a necessidade de prescrição normativa de um ajuste mínimo, bem como que a autonomia dos entes federados, pelo nosso próprio ordenamento jurídico, não é ilimitada. Entretanto, é engano pensar que a tão propalada reforma tributária reduzirá ou exterminará os mecanismos utilizados pelos entes federados para defesa de seus interesses, ainda que contrários ao ordenamento jurídico. O conflito de interesses entre a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, apesar de ser um dos fundamentos pelos quais a Constituição Federal permite a criação de normas gerais em matérias tributárias para regulação do exercício de competências, será resolvido, tão somente e em última análise, pelos órgãos do Poder Judiciário e, nunca, pela desenfreada criação de leis. (Publicado na Tribuna do Norte)